MÃE,
POR QUE EU PRECISO IR À ESCOLA?
PÉPE E SEU GRANDE OLHO IAM À
ESCOLA.
PÉPE NÃO SABIA POR QUÊ.
SÓ SENTIA SUA GRANDE
MOCHILA.
HAVIA MUITOS OUTROS OLHOS
QUE IAM À ESCOLA.
LÁ, HAVIA OLHOS MIUDINHOS
POR TODA A PARTE.
E GRANDES BOCAS, QUE FALAVAM,
FALAVAM.
MAS PÉPE NÃO OUVIA. PÉPE NÃO
TINHA OUVIDOS.
ÀS VEZES, PÉPE TAMBÉM NÃO
TINHA CORPO.
ELE NÃO CONSEGUIA IMAGINAR O
QUE OS OUTROS OLHOS IMAGINAVAM.
ENTÃO, SEU CORPO SE REPARTIA
EM MIL PEDAÇOS.
PÉPE, ENTÃO, ERA SÓ OLHOS DE
NOVO. E GRANDES: AS COISAS PERIGOSAS PODEM VIR DE QUALQUER LADO.
UM DIA, A MOCHILA FICOU
AINDA MAIOR.
SEU OLHO-MÃE O ARRASTAVA
PARA A ESCOLA.
O PESO DA MOCHILA ERA TANTO,
MAS TANTO, QUE PÉPE SENTIU UM BURACO. DESCOBRIU QUE TINHA UMA BOCA.
A COCEIRA QUE VINHA DO FUNDO
DO CORPO FEZ PÉPE JORRAR UMA PERGUNTA:
- MÃE, POR QUE PRECISO IR À
ESCOLA?
A BOCA DA MÃE MEXIA. PÉPE
NÃO TINHA OUVIDOS. NÃO CONSEGUIU IMAGINAR O QUE SAÍA DA BOCA DA MÃE.
FOI A VEZ EM QUE A CABEÇA DO
PÉPE CAIU.
SÓ O CORPO DE PÉPE FOI À ESCOLA.
MAS NÃO DEIXAVA DE SER PÉPE.
A PERGUNTA FEZ CRESCER BOCAS
POR AÍ.
UM DELAS DISSE QUE PÉPE IA À
ESCOLA PARA SER O PÉPE.
ESSA PALAVRA MÁGICA FEZ O
CORPO E A CABEÇA SE UNIREM.
AGORA, PÉPE CONTINUAVA COM
UMA GRANDE CABEÇA – COM DOIS OLHOS E UMA BOCA.
OS OLHOS DORMIRAM, E A BOCA
PÔDE RONCAR FELIZ.
AMANHECEU OUTRO DIA DE AULA.
A MÃE E O PAI, E O VÔ E A VÓ
ARRASTARAM PÉPE CABEÇÃO, OLHÃO REMELENTO, BOCÃO RONCADOR E CORPÃO DESMONTADO
PARA A ESCOLA OUTRA VEZ.
VEIO OUTRA COCEIRA TÃO
FORTE, QUE SALTARAM ORELHAS NO SEU CABEÇÃO.
ELE NÃO ESTAVA ACOSTUMADO
COM AQUILO.
LÁ DO FUNDO, BERROU BEM ALTO
PARA QUE SUAS ORELHAS O OUVISSEM:
- MÃE, POR QUE PRECISO IR À
ESCOLA?
PÉPE ESCUTOU A SI MESMO.
NEM DEU PELA RESPOSTA DA
MÃE, DO PAI, DO VÔ, DA AVÓ, DO AVÔ, DA PROFESSORA, DA VIZINHA, DO CACHORRO DA
IRMÃ DA VIZINHA, DA LAVADEIRA DA PRIMA DA CUNHADA DA VIZINHA....
ERA MUITA GENTE FALANDO, MAS
TANTA GENTE... QUE O CORPO DO PÉPE SE PARTIU EM MIL PEDAÇOS.
DEVAGAR, OS OUVIDOS NOVOS DO
PÉPE OUVIAM, LÁ DE LONGE, VOZES QUE ATRAVESSAVAM SEU CORPO.
O CORPO SE UNIA NOVAMENTE.
A MÃE, O PAI, O AVÔ, A AVÓ,
A PROFESSORA QUISERAM ARRASTAR NOVAMENTE PÉPE PARA ESCOLA.
ELE RESOLVEU UM CORPO E UMA
CABEÇA E ATIRAR PARA DENTRO DE SI A PERGUNTA:
- POR QUE EU TENHO QUE IR À
ESCOLA?
TODO SEU CORPO OUVIU. SUAS
ORELHAS, SUA BOCA E CADA UM DOS SEUS MEMBROS E ÓRGÃOS SOUBE QUE OS OLHOS,
GRANDES OU MIÚDOS, E AS BOCAS, GRANDES OU PEQUENAS, QUE ESTÃO NA ESCOLA, EM
CASA E EM TODOS OS LUGARES SÃO APENAS BOCAS E OLHOS.
PÉPE AGORA TINHA UM ROSTO.
UM ROSTO E UM CORPO.
E UM ROSTO E UM CORPO DE
OLHAR O MUNDO.
SUAS PUPILAS SE TORNARAM
DOIS GRANDES PONTOS DE INTERROGAÇÃO.
E MUITOS PONTOS DE
INTERROGAÇÃO TAMBÉM SURGIRAM EM CASA, PELAS PAREDES, PELOS LIVROS, NA TELA DO COMPUTACOCEIRA.
QUANDO AMANHECEU OUTRO DIA
DE AULA, NINGUÉM ARRASTOU PÉPE.
ELE ESTAVA GRANDE DEMAIS
PARA SER ARRASTADO.
ELE TINHA PASSOS DE LÉGUAS.
E FOI PARA A ESCOLA PORQUE
SEUS OLHOS SÓ SABIAM ESSE CAMINHO DE IR.
O CAMINHO TAMBÉM ESTAVA
CHEIO DE PONTOS DE INTERROGAÇÃO.
A ESCOLA ESTAVA CHEIA DE
PONTOS DE INTERROGAÇÃO.
PÉPE, COM TODO O SEU CORPO,
ABRIU A BOCA, E DELA SALTARAM TODAS AS INTERROGAÇÕES QUE ESTAVAM PRESAS EM SUA
GARGANTA.
AS INTERROGAÇÕES DE PÉPE
MISTURARAM-SE ÀS INTERROGAÇÕES DA MARIA,
DO EDUARDO, DO FÁBIO, DA ANA, DA CAROLINA, DA CAMILA, DO VÍTOR, DA GABRIELA, DA
OUTRA GABRIELA, DA LETÍCIA, DO BERNARDO...
UM ARCO-ÍRIS DE
INTERROGAÇÕES COLORIU OS CÉUS DA ESCOLA, DA CIDADE E DO MUNDO.
OS OLHOS DO PÉPE – E DE
TANTOS OUTROS PÉPES – GOSTARAM DAQUILO.
E AS RESPOSTAS ERAM MUITAS,
VINDAS DE MUITAS E MUITAS BOCAS.
OS OUVIDOS GOSTAVAM DE UMAS,
NÃO GOSTAVAM DE OUTRAS.
O CÉREBRO FILTRAVA. O
CORAÇÃO ESCOLHIA.
DA BOCA DE PÉPE, AINDA SAEM
E SAIRÃO, SEMPRE, MUITAS PERGUNTAS.
MAS O QUE ELE SABE, DE VERDADE,
COM TODO O SEU CORPO, É QUE ESTÁ NA
ESCOLA E NA VIDA PARA SER ELE MESMO.
PARA SER FELIZ.