terça-feira, 30 de agosto de 2011

Sessão de autógrafos na Feira do Livro de Porto Alegre

Falta mto tempo, eu sei, mas já está marcada a sessão de autógrafos de "A sinistra casa da Vovó Sinistra" na Feira do Livro de Porto Alegre:

Domingo, 13 de novembro, às 17 horas.

Bem feliz!!!

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Sinistrando por aí - Colégio Cenecista - Estância Velha

Ontem à tarde, fui conversar sobre "A sinistra casa da Vovó Sinistra" com alunos do quarto e quinto anos do Colégio Cenecista de Estância Velha. Que crianças mais queridas! E inteligentes! E criativas! Fiquei boquiaberta com as perguntas que me fizeram. Prestaram atenção a cada detalhe do livro. Mas o que mais me chamou a atenção foi a leitura das imagens que fizeram. Pelas perguntas, pude perceber que conseguiram fazer uma leitura "global", aliando imagem e texto - como deve ser, afinal... Também se percebe claramente a mediação das profes na hora de estimular, conduzir - o que faz toda a diferença!
Fiquei muito, muito feliz com a curiosidade dos alunos, com o carinho e com o entusiasmo.
Seguem algumas fotos...








terça-feira, 2 de agosto de 2011

Em Roma, como os romanos - versão II

Sufocantes 40 graus às nove da manhã. Ana tinha a impressão de que, se  fosse à janela do hotel e gritasse “Bom dia, Roma!”,  haveria um brasileiro pra devolver “Bom dia por quê?”. Ou um tipinho italiano pra passar uma cantada nojenta. Isso se alguém ouvisse, barulheira que era aquela avenida. Atravessar um oceano pra ficar num hotelzinho perto de rodoviária! Claro, não era como hotelzinho de rodoviária no Brasil, ou como imaginava um, deus-a-livrasse, nunca botara seu rico pezinho num pardieiro. Mas ser hotelzinho de rodoviária. Se alguém descobrisse isso, nunca mais botaria  pé na rua de tanta vergonha. Acrescida a poluição ao calor, o dia estava irrespirável. E ali estava Ana, de novo, seguindo um bando de turistas descerebrados. Tinha que estar, pagara, faria o quê? Quem mandava ser jeca e ter medo de se aventurar sozinha no “Velho Mundo”?
Ana só não se considerava mais grosseira do que essa guia espanhola que a agência arrumara. Tá certo, pensava ela,  mais da metade do grupo era de caturritas argentinas e paraguaias que não paravam de papaguear o espanhol deles. Mas nem eles pareciam entender a tal da guia atarrascada. Mas não precisava muito. Ela falava iglesia, iglesia, iglesia, calle estreita, calle estreita.
"Eu merecia entrar no Museu do Vaticano melhor assessorada" - pensou Ana. - "Não consigo prestar atenção nessa patacoada ultracatólica que ela está recitando. E tanta gente, lembrei de Drummond, pra que tanta perna, meu Deus? E os meus olhos perguntam tudo..."
Ela tentava obedecer ao comando da "La capitán", como apelidaram a guia espanhola enfezada. Seus olhos, no entanto, embracaram seus pensamentos em outro passeio:
"Tem cada um que a mais imponente tapeçaria perde graça. Acho que gosto mais de bicho-gente do que bicho bordado, bicho esculpido, bicho pintado. Acho que os bichos que pintaram e bordaram é que são o tal. Falando nisso, aquele casal de caturritas eu não tinha visto ainda. De onde surgiram? Olha o naipe da gordinha puxando o marido. Quero dizer, acho que é marido, sei lá. Vai saber. Não está nem aí pro papo da Guia. Está olhando o que quer, apontando, gesticulando. A guia a chamou e a gorducha só lançou um olhar de deboche. Gostei dessa.Mas e a roupa da criatura? Twin set verde, bermuda abaixo do joelho. Roupa feia, só isso o que entrou nela. Mas e os pés? Coitada, bolhas abertas, tudo inchado. Está mancando de vez em quando. A guia a chamou de novo. De onde será que ela é? Gorda assim, só pode ser americana. Ou daquelas mexicanas que conseguem visto. Claro que é chicana, é só olhar o jeito despachado. Como entenderia a guia se não fosse. Mas tem alguma instrução. Aquela pinta sobre os lábios dão um certo ar de ascendência espanhola. É branca, branca, com os cabelos crespos e escuros. Deve ter uma empresa de prestação dos serviços que os americanos acham que não podem fazer. Forrou a carteira e casou com aquele americano, tem cidadania, tá feita na vida. Sim, porque o marido só pode ser americano. Ou de qualquer outro país bem acima dos trópicos. Na verdade, tem cara de alemão. Mas houve imigração forte de alemães para os Estados Unidos. Explicado. Bingo."
A guia chamou a “Señora” pela quarta vez para juntar-se ao grupo. A Señora veio, rindo-se. A guia explicou:  a escultura diante dos seus olhos veio a Roma trazida pelos soldados da santa igreja... A "Señora" pigarreou e fez  “Rãrrã” . Os olhos da senhora eram todo faíscas. A pinta sobre os lábios movimentou-se e...
- Ô, Dona Guia "La Capitán", se sabem de onde tudo isso foi roubado, por que diabos a igreja não devolve?
Um susto anima o passeio de Ana:
"Quê? Ela fala português? Ela é brasileira, como eu? A coragem da outra de perguntar isso logo pra quem. Nada de visto comprado, nada de dieta à base de MacLanche, nada de história mirabolante."
 A guia encolerizou-se. Uma metralhadora de palavras. A  brasileira estava à frente dela. Braços à cinta, sorriso irônico, olhos faiscantes. Olha diretamente nos olhos de "La Capitán". "Esse olhar é capaz de hipnotizar uma naja." - pensou Ana.  O marido ria, cúmplice. A guia metralhou, explodiu, denotou xingamentos. A gordinha? Firme e serena. Autocontrole, cinismo puro e delicioso.
A guia cansou, afinal. A co-patriota de Ana apenas disse:
- Eu estou indo à Capela Cistina.
ASeñora olhou para Ana. No fundo dos olhos. "Alguém finalmente me vê em Roma" - pensa a moça. E disse:
- Alguém mais vem conosco?
É claro que Ana foi. E mais alguns. E muitas pessoas. Não são mais caturritas. E outros e outras. A guia ficou para trás. Só bandos é que precisavam de líder.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Em Roma, como os romanos

Sufocantes 40 graus às nove da manhã. Tenho a impressão de que se eu fosse à janela do hotel e gritasse “Bom dia, Roma!” certamente haveria um brasileiro pra me devolver “Bom dia por quê?”. Ou um tipinho italiano para me passar uma cantada nojenta. Isso se alguém ouvisse, barulheira que é aquela avenida. Atravessar um oceano pra ficar num hotelzinho perto de rodoviária! Claro, não é como hotelzinho de rodoviária no Brasil, ou como imagino que seja um, deus-me-livre, nunca botei meu rico pezinho num pardieiro, mas não deixa de ser hotelzinho de rodoviária. Se alguém descobre isso, nunca mais boto meu pé na rua de tanta vergonha. Acrescida a poluição ao calor, o dia está irrespirável. E aqui estou eu, de novo, seguindo um bando de turistas descerebrados. Tenho que estar, paguei, fazer o quê? Quem manda ser jeca e ter medo de se aventurar sozinha no “Velho Mundo”? É o preço que eu pago por grossa...


Só não sou mais grosseira do que essa guia espanhola que nos arrumaram. Tá certo que mais da metade do grupo é de caturritas argentinas e paraguaias que não param de papaguear o espanhol deles. Mas nem eles parecem entendê-la. Mas não precisa muito. Ela só sabe falar iglesia, iglesia, iglesia, calle estreita, calle estreita. Eu merecia entrar no Museu do Vaticano melhor assessorada. Não consigo prestar atenção nessa patacoada ultracatólica que ela está recitando. E tanta gente, lembrei de Drummond, pra que tanta perna, meu Deus? E os meus olhos perguntam tudo...

Tem cada um que a mais imponente tapeçaria perde graça. Acho que gosto mais de bicho-gente do que bicho bordado, bicho esculpido, bicho pintado. Acho que os bichos que pintaram e bordaram é que são o tal. Falando nisso, aquele casal de caturritas eu não tinha visto ainda. De onde surgiram? Olha o naipe da gordinha puxando o marido. Quero dizer, acho que é marido, sei lá. Vai saber. Não está nem aí pro papo da Guia. Está olhando o que quer, apontando, gesticulando. A guia a chamou e a gorducha só lançou um olhar de deboche. Gostei dessa.

Mas e a roupa da criatura? Twin set verde, bermuda abaixo do joelho. Roupa feia, só isso o que entrou nela. Mas e os pés? Coitada, bolhas abertas, tudo inchado. Está mancando de vez em quando. A guia a chamou de novo. De onde será que ela é? Gorda assim, só pode ser americana. Ou daquelas mexicanas que conseguem visto. Claro que é chicana, é só olhar o jeito despachado. Como entenderia a guia se não fosse. Mas tem alguma instrução. Aquela pinta sobre os lábios dão um certo ar de ascendência espanhola. É branca, branca, com os cabelos crespos e escuros. Deve ter uma empresa de prestação dos serviços que os americanos acham que não podem fazer. Forrou a carteira e casou com aquele americano, tem cidadania, tá feita na vida. Sim, porque o marido só pode ser americano. Ou de qualquer outro país bem acima dos trópicos. Na verdade, tem cara de alemão. Mas houve imigração forte de alemães para os Estados Unidos. Explicado. Bingo.

A guia a chama a “Señora” pela quarta vez para juntar-se ao grupo. A Señora vem, rindo-se. A guia explica que a escultura diante da qual faz todos pararem veio a Roma trazida pelos soldados da santa igreja... Não ouço mais nada além do “Rãrrã” que a “Señora” faz. Ela vai interromper a guia, eu sei que vai...

Os olhos da senhora são todo faíscas. Vejo a pinta sobre os lábios movimentar-se e....

- Ô, Dona Guia, se sabem de onde tudo isso foi roubado, por que diabos a igreja não devolve?

Quê? Ela fala português? Ela é brasileira, como eu? A coragem da outra de perguntar isso logo pra quem. Nada de visto comprado, nada de dieta à base de MacLanche. A guia encoleriza-se. Sei lá o que está xingando. Ela virou uma metralhadora de palavras. A gorda brasileira está à frente dela. Braços à cinta, sorriso irônico, olhos faiscantes. Olha diretamente nos olhos da guia. Esse olhar é capaz de hipnotizar uma naja. O marido ri, cúmplice. A guia metralha, explode, denota palavras. A gordinha está firme e serena. Autocontrole e cinismo puro e delicioso. Por que ela não se controla assim na frente de doces? Ou será que ela sabe o gozo puro?

Quando a guia cansa, a minha co-patriota apenas diz:

- Eu estou indo à Capela Cistina.

Ela olha para mim. Alguém finalmente me vê em Roma. E me diz:

- Alguém mais vem conosco?

É claro que eu vou. E mais alguns. Não são mais caturritas. E mais outros e outras. A guia fica para trás. Só bandos é que precisam de líder.