segunda-feira, 31 de outubro de 2011

E quem não subscreveria também esta cartinha?

Nem é preciso ser habitante do Mundo da Fantasia para querer subscrever a cartinha do Pequeno Polegar para a Dona Benta em "O Picapau Amarelo":

         "Prezadíssima Senhora Dona Benta Encerrabodes de Oliveira:

         Saudações. Tem esta por fim comunicar a Vossa Excelência que nós, os habitantes do Mundo da Fábula, não aguentamos mais as saudades do Sítio do Picapau Amarelo e estamos dispostos a mudar-nos para aí definitivamente. O resto do mundo anda uma coisa das mais sem graça. Aí que é o bom. Em vista disso, mudar-nos-emos todos para sua casa – se a senhora der licença, está claro... "

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Bate-papo com alunos das escolas municipais na Feira do Livro de Campo Bom - 20/10/11

Na quinta-feira passada, tive a felicidade, o privilégio e a honra de conversar com uma gurizada pra lá de inteligente, perspicaz e criativa: turmas de alunos de terceiro, quarto e quinto anos de algumas escolas do município de Campo Bom - minha terrinha.
Pode comprovar, em experiência bem concreta, o quanto o leitor é co-autor de uma obra. Cada detalhe que eles perceberam, cada leitura inusitada, cada pergunta interessante - haja fôlego pra responder. Cheguei a uma conclusão: o autor não sabe nada do livro que escreveu. Quem sabe é Sua Majestade, o leitor!
Essas perguntas todas, para mim, soaram como carinho: o leitor que quer saber, mas no fundo ele já tem a resposta - e muito melhor do que a do autor. Melhor porque é sua. É fruto de sua criação. E fim de papo.
As profes e os seus alunos fizeram um belíssimo trabalho. Parabéns! Além disso, o comportamento foi nota mil!
Emocionei-me em ver representada a minha antiga escola, a EMEF Santos Dumont, onde fui alfabetizada e, coincidentemente (?), comecei a minha vida de professora. E, para acompanhar os alunos, estavam a Profe Simone, (minha colega dos tempos de infância, para quem eu passei a faixa de "Mais bela..." bem, deixa pra lá...) e a Profe Carmen, que é aluna do curso de Letras da Faccat...
Também encontrei minhas colegas do curso de Magistério (e lá se vão 23 anos só de sala de aula!): Viviane Gertz, Carla, Tânia... Estamos quase de "bodas de prata" com a profissão! E a Profe Márcia, minha ex-colega no Santos..
Também gostei de ver a curiosidade nos olhinhos dos alunos da EMEF Marquês do Herval, ao saber que a "escritora" aqui mora na rua da escola deles... :)
Muito obrigada a todos pelo carinho, pela leitura atenta... por tudo!

Amei o desenho que a aluna Naiara Foleto, da EM 25 de julho, fez! Olha ele aí embaixo:








Olha a Naiara aí!



Os alunos da EMEF Santos Dumont, com as Profes Carmen e Simone




quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Recadinho da Dona Benta, em "Viagem ao Céu"

Essa é para quem está super, mega estressado hj - como eu!!!



Fala da personagem Dona Benta, logo na primeira página de "Viagem ao Céu":

"[...] porque a maior parte da vida passamos entretidos em tanta coisa, a fazer isto e aquilo, a pular daqui pra ali, que não temos tempo de gozar o prazer e viver. Vamos vivendo sem prestar atenção na vida e, portanto, sem gozar o prazer de viver à moda dos lagartos. Já repararam como os lagartos ficam horas e horas imóveis ao sol, de olhos fechados, vivendo, gozando o prazer de viver - só, sem mistura?" 

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Aos 62

Aos 62




Ana precisava deter o tempo. Reter e expandi-lo. Não era só ela que pensava assim. As capas de revistas diziam. As figuras nos outdoors. Os olhares inquisidores. Não sabia se era ela que pensava assim ou se pensavam por ela. Tanto faz. Não discutia. Era preciso, simples assim. Mas não era dada aos excessos: a natureza fora-lhe generosa. Ela só se incumbira de esconder os poucos fios de cabelos brancos, quase imperceptíveis em sua loirice natural. Visitou, como de costume, o cabeleireiro. Retoque nas raízes, coisa pouca. Deus, para ela, morava nos detalhes.

Ficou bem, ela achou. Mas não tinha tempo de achar mais. Ela era muitas em uma. Precisava pagar uma conta já em vias de vencer. Teve uma leve raiva da greve dos carteiros. Ela fora funcionária pública durante tantos anos. Na metade do caminho em direção à agência bancária, exasperou-se com a lembrança: os bancários também estavam em greve. Precisava pensar rápido – e pensou. Orgulhou-se da rapidez de seus pensamentos: a agência lotérica era ali pertinho.

Uma quadra depois, Ana avistou longa fila. Constatou que era a da lotérica. Não se fez de rogada: os seus 62 anos valeriam, afinal, para algo imediato. Sabia que era bonita – bonita porque mulher. Ergueu a cabeça, equilibrou-se sobre os saltos, retiniu as pulseiras. Passou ao lado da fila, perguntou ao guarda pela fila de idosos. O homem a olhou de cima a baixo, demorado. Braço flácido, estendeu, tímido, o dedo indicador.

Ana encarregou-se de não perceber. Divertiu-se, no fundo. Posicionou-se na fila indicada, muito menor. O rapaz que era o primeiro da fila ao lado comentou algo com a moça do caixa. Ana ouviu um mal-humorado “pergunta pra ela”. Engraçadíssimo. Sentia que todos a olhavam. Parecia jovem, sim, não era isso que queriam? Ouvia fragmentos de conversa. Ela não poderia ter mais de 60 anos. Outra voz fez questão de dizer mais alto que ela só poderia ter problemas mentais. O orgulho inicial deu vez à vergonha. Uma moça magrinha saiu de trás da fila, esbarrou propositalmente em Ana, quase lhe derrubando a bolsa. Foi até a moça do caixa. Denunciou, retumbante: havia pessoas furando a fila. A loirosa ali não tinha idade para a fila dos idosos. A moça do caixa repetiu a resposta: pergunta pra ela.

Pergunta pra ela, pergunta pra ela. A moça magrinha não estava só no coro dos descontentes. Na frente de Ana, só um senhorzinho já sendo atendido. Ana pensava: “Só mais um pouquinho, só mais um pouquinho. É meu direito, pombas!”.

Quando chegou a sua vez no caixa especial, com calma disfarçada, segurando a mão para não tremer, escorou-se no balcão, tirou carteira e contas. A moça da fila ao lado sorriu:

- Mas a senhora não parece mesmo ter sessenta anos.

Foi a gota d’água. Ana sacou a carteira de identidade. Colocou bem junto ao rosto da vizinha de caixa:

- Sabe fazer conta? Dois mil e onze menos um mil, novecentos e quarenta e nove, quanto dá? Hein? Hein? E eu é que sou loira, né?

Olhou pra trás, fuzilando o povo. Alguém gostaria de tentar calcular de cabeça?

A atendente sorriu para ela, solidária na beleza e na cor das madeixas: a senhora é mesmo muito bonita. No que Ana agradeceu, juntando a simpatia possível no momento. A atendente devolveu o troco, cochichando um inaudível “vai firme”.

E Ana foi. Sacudindo os cabelos. Caminhando ligeiro. Pensando rápido. Aos 62 anos de idade.